Países que conseguiram melhorar o planejamento e usaram parcerias com a iniciativa privada conseguiram evoluir mais rapidamente na melhoria do saneamento, aponta levantamento feito pela CNI (Confederação Nacional da Indústria).
O trabalho, obtido pela Folha, analisou dados sobre pelo menos oito países nos quais houve melhorias em indicadores que compõe o saneamento, entre eles coleta de esgoto, implantação de rede de abastecimento de água ou redução de perdas.
Nesses quesitos, o Brasil continua cada vez mais longe de cumprir metas estabelecidas na década passada no Plano Nacional de Saneamento, de universalizar o acesso a água e esgoto até 2033. Os dados analisados nesse trabalho apontam que o país continua pelo menos 20 anos atrasado.
Os dados também mostram que o Brasil está longe em relação a outros com o mesmo nível de desenvolvimento. Chile, Argentina, China e Rússia têm índices de tratamento de esgoto muito superiores, mesmo com renda per capita semelhante.
O trabalho defende que o país adote medidas para avançar na privatização do setor, o que ajudou a melhorar índices em alguns dos casos estudados. O Chile é usado como exemplo por ter conseguido, em duas décadas, atingir praticamente 100% de saneamento. Alemanha e Japão também usaram a iniciativa privada para avançar.
ESTATAL
No Brasil, o sistema é fortemente estatal. O governo tem um plano, liderado pelo BNDES, de aumentar as privatizações no setor, mas que sofre resistência de movimentos de esquerda e sindicatos de companhias estatais.
Especialista em Políticas e Indústria da CNI, Ilana Ferreira, responsável pelo estudo, aponta que são necessários cuidados para que as privatizações tenham efeito real na melhoria do sistema de saneamento.
Segundo ela, o Peru tentou privatizar o saneamento, mas não obteve melhorias. O país vizinho não tinha uma regulação adequada para conceder os serviços e, por isso, não houve interesse da iniciativa privada. Para ela, é necessário desenvolver, antes das concessões no Brasil, planos municipais de saneamento, o que poucas cidades têm.
“É preciso planejar. Só assim é possível determinar que, se você levar a galinha dos ovos de ouro, terá de considerar uma população que não tem dinheiro para pagar.”
Outro problema, segundo ela, são os chamados subsídios cruzados, comuns no sistema. Para Ilana, esse tipo de subsídio, em que um grupo paga mais para outro pagar menos, gera distorções. Para a especialista da CNI, os subsídios que funcionam são aqueles dados pelo governo, com recurso do Orçamento.
Ilana disse que há trabalhos apontando que, no Brasil, as empresas privadas já existentes conseguiram melhores índices de qualidade e frequência do atendimento e de expansão da rede que as empresas públicas, sem que os custos para os consumidores seja muito superior.
Relator especial da ONU sobre água e saneamento, Leo Heller afirma, por outro lado, que o caráter de monopólio natural desses serviços gera dificuldades naturais para as concessões, o que leva a riscos nos casos de privatização. Ele lembra também das fragilidades dos governos para fiscalizar as concessionárias privadas.
“A regulação dos serviços em monopólio é usualmente frágil e insuficiente, quando não capturada pelo prestador do serviço”, aponta Heller.
Segundo ele, países como Canadá e Estados Unidos, onde a gestão é praticamente toda pública, têm sistemas de qualidade. Os dois países são citados no estudo como exemplos em áreas como planejamento e conservação de recursos hídricos.
Heller afirma ainda que alguns países no mundo, como a França, estão revertendo concessões por motivos como descumprimento de contratos, insatisfação dos usuários com tarifas e falta de atendimento a áreas mais pobres.
Fonte: Folha SP