Se você tem um emprego formal, provavelmente trabalha oito horas por dia, de segunda a sexta-feira.
É claro que muitos de nós trabalham mais – Elon Musk afirmou em entrevista ao New York Times que chega a trabalhar 120 horas por semana, basicamente anulando a possibilidade de equilibrar vida pessoal e trabalho.
Não há vantagens em passar tanto tempo no escritório: vários estudos sugerem que jornadas longas nos deixam mais infelizes e improdutivos.
Portanto, em um esforço de melhorar o equilíbrio entre vida e trabalho, empresas e governos ao redor do mundo estão experimentando encurtar o número de horas trabalhadas.
Esse é um movimento que atrai grande interesse – um recente teste na Nova Zelândia gerou manchetes internacionais após cortar a semana de trabalho de cinco para quatro dias.
Mas por que afinal parar em quatro dias? Por que não podemos trabalhar três, dois ou até metade de um dia por semana? Será que existe um ponto ótimo em que a redução das horas de trabalho ainda compensa financeiramente?
Experimento dos 4 dias
Perpetual Guardian é a empresa de fundos de pensão da Nova Zelândia que experimentou remover um dia de trabalho da semana de seus funcionários.
Como funcionou: por duas semanas em maio, a companhia pediu a seus 240 profissionais que fizessem a jornada diário de 8 horas por quatro dias em vez de cinco (eles continuaram a ser pagos por cinco dias).
Pesquisadores da Universidade de Auckland e da Universidade de Tecnologia de Auckland posteriormente entrevistaram os empregados. O resultado: 24% disseram que o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal melhorou, e 7% notaram uma redução do estresse. Enquanto isso, os cargos de chefia não registraram redução em produtividade.
O serviço ao consumidor até melhorou, diz Jarrod Haar, professor de gestão e recursos humanos da Universidade de Tecnologia de Auckland, que ajudou a coordenar o estudo.
“Quando eles começaram o teste, o chefe disse que se eles não conseguissem manter 100% de produtividade, ou próximo a isso, nos quatro dias, então eles voltariam ao horário normal. Então, a equipe teve uma motivação.”
Esse tipo de experimento não está sendo realizado apenas no sul do Pacífico. Em 2016, a cidade de Reykjavik, na Islândia, divulgou os resultados de um estudo com duração de um ano que cortou metade de um dia de trabalho por semana de empregados de tempo integral em alguns escritórios municipais.
O experimento mostrou que tanto os custos quanto a produtividade continuaram os mesmos, mesmo com menos tempo tendo sido passado no escritório.
A Suécia fez algo parecido, com testes envolvendo vários empregadores, desde startups a asilos – Svartedalen, uma instituição de cuidados a idosos, foi além e instituiu a semana de trabalho de 32 horas.
No Japão, onde há uma palavra específica para “morte por trabalhar em excesso”, o governo introduziu uma medida chamada “segundas brilhantes”, nas quais as empresas podem dar aos empregados a oportunidade de chegar mais tarde no trabalho uma segunda-feira por mês.
Melhorar o equilíbrio entre a vida pessoal e o trabalho acaba poupando dinheiro das companhias porque empregados mais felizes têm menos chances de pedirem demissão, diz Jan Emmanuel De Neve, professor associado de economia e estratégia da Escola de Negócios Saïd, da Universidade de Oxford.
Em sua pesquisa, ele descobriu que esse equilíbrio é uma das maiores prioridades para a satisfação com a vida e fica na frente inclusive do quanto as pessoas consideram seus empregos interessantes.
“Você quer que as pessoas fiquem, porque a rotação de empregados é incrivelmente cara”, explica De Neve, que também é editor associado do Relatório Mundial de Felicidade.
Ele ressalta ainda que, em 1930, o economista John Maynard Keynes previu que estaríamos trabalhando apenas 15 horas por semana, por conta dos avanços tecnológicos e dos ganhos de produtividade.
Isto traz a pergunta…
Em quanto podemos reduzir a jornada?
O quão curta poderíamos tornar a nossa semana de trabalho? Que tal quatro horas por semana?
O autor Tim Ferriss ficou famoso há quase uma década com seu livro The 4-Hour Workweek (A semana de trabalho de quatro horas, em tradução livre), que levantou essa ideia. Sua teoria defende que é possível escapar de um estilo de vida workaholic reduzindo o acesso ao e-mail a duas vezes por dia, usando cronômetros online para aumentar a eficiência e terceirizando e-mails a assistentes virtuais.
É improvável que qualquer empresa consiga funcionar com uma equipe aparecendo no trabalho por apenas algumas horas por semana – o livro de Ferriss é voltado especialmente para indivíduos buscando maximizar sua eficiência pessoal.
Mas cortar o número de horas trabalhadas pode tornar as pessoas mais produtivas – no exemplo da Perpetual Guardian, a semana de trabalho mais curta mudou a forma como a equipe trabalhava para se realizar mais em menos tempo. Por exemplo, os funcionários chegavam na hora, não saíam cedo e pulavam os intervalos longos. (É bom lembrar que passamos em média duas horas por dia nas redes sociais, segundo relatório da consultoria GlobalWebIndex).
Se semanas com quatro horas de trabalho estão fora de cogitação, poderíamos ao menos reduzir a jornada em dois ou três dias?
Não é tudo o que dizem
Não é assim tão fácil, dizem especialistas – há um ponto de inflexão em que os custos começam a ultrapassar os benefícios, até em jornadas de quatro dias.
Os experimentos na Suécia e na Nova Zelândia mencionados acima ganharam muitas manchetes na época – mas pouco ouvimos falar deles depois disso.
A Treehouse, uma empresa americana de educação online, acabou voltando às 40 horas semanais depois de testar o esquema de quatro dias. Ela enfrentou corte de gastos e demissões – e não foi bem visto despedir trabalhadores enquanto outros continuavam a trabalhar quatro dias por semana.
A diretora de marketing da Treehouse, Megan Dorcey, afirmou à BBC Capital que o padrão de cinco dias por semana, oito horas por dia, melhorava a comunicação da equipe (que está distribuída por fusos horários diferentes nos Estados Unidos). Além disso, os clientes queriam ter o serviço durante o horário comercial.
E quanto ao experimento sueco no asilo de Svartedalen? Também não durou muito. (Principalmente porque ele foi desenvolvido para ser temporário, mas os resultados sugeriram que o esquema não era sustentável). Henrik Dahlberg, porta-voz da cidade de Gothenburg, diz que eles voltaram à jornada de 40 horas por semana.
Para se garantir que todos trabalhassem seis horas por dia, a unidade precisou contratar uma equipe extra. Esse esquema e outros parecidos afetaram o orçamento do município, aumentando o déficit no setor de bem-estar social. “Considerando-se isso, é pouco realista sugerir cortes drásticos na jornada de trabalho”, diz Dahlberg.
Ele acrescenta que a liderança do partido de esquerda no governo tem pressionado por mais testes, mas a falta de equipe treinada e outras condições econômicas reduzem as chances de isso ocorrer. Dahlberg aponta para uma fábrica da Toyota nas proximidades, que há 13 anos mudou e mantém a jornada de seis horas, o mesmo feito por um departamento de um hospital universitário local.
Embora os custos sejam um grande fator, há ainda outras considerações.
Haar, do estudo da Nova Zelândia, avalia que haveria redução no lucro se os trabalhadores que aparecessem menos de quatro dias por semana. Embora alguns funcionários tivessem maior satisfação trabalhando três dias por semana, a produtividade não seria a mesma. “Minha intuição diz que, para se reduzir o tempo de trabalho mantendo-se a eficiência, a jornada não deve ser menor que de quatro dias”, diz Haar.
O professor de Oxford, De Neve, concorda. Cortar mais dias ou horas de trabalho “vai gerar cada vez menos impacto”, diz. Ao se reduzir a jornada de cinco para quatro dias, “eles já encontraram o ponto ótimo”.
E quanto à implementação de um esquema de longo prazo na Perpetual Guardian? Um porta-voz diz que a companhia ainda decidirá se torna a jornada de quatro dias permanente – o conselho ainda está revendo e debatendo os resultados do estudo.
Portanto, provavelmente podemos esperar mais tentativas de implementar jornadas mais curtas em indústrias onde isso é possível: mais dias para folga e menos dias para dar conta das tarefas. Afinal de contas, ainda temos que testar a hipótese de Keynes.
“Essas opções estão mais disponíveis e sendo adotadas por mais funcionários”, diz De Neve. “Isso está longe de ser uma invenção só para chamar atenção”.
Fonte: BBC Brasil