Estudo elaborado pelo Fórum Econômico Mundial prevê que milhões de empregos serão transformados; qualificação profissional é a saída para captar as oportunidades
Gestor de mídias sociais, cientista de dados, analista de SEO, blogueiro, desenvolvedor de aplicativos. Essas são algumas das profissões que surgiram nos últimos anos, oferecendo oportunidades que o mercado de trabalho sequer imaginava até pouco tempo atrás. O rápido avanço da tecnologia tem reinventado os modelos de negócio, em um processo que tende a se intensificar no futuro próximo, traduzindo-se em desafios e oportunidades para milhões de trabalhadores em todo o mundo.
Profissões tradicionais, como carteiro, operador de telemarketing, taxista, agente de viagens, entre tantas outras, estão perdendo espaço para a tecnologia. Um exemplo dessa transformação é a companhia australiana Fastbrick Robotics, que desenvolveu um protótipo de robô capaz de construir uma casa em apenas dois dias (veja vídeo aqui). Agora, a empresa trabalha para o lançamento comercial do produto, que promete revolucionar a construção civil.
Assim como o robô da Fastbrick Robotics, outras ferramentas se posicionam para revolucionar o modo como profissionais de todos os setores atuam. “As novidades derivadas dos avanços na Inteligência Artificial e Robótica estão gerando oportunidades de novas aplicações em áreas antes não exploradas, bem como remodelando algumas áreas tradicionalmente estabelecidas”, explica Sandro Rigo, coordenador do Programa de Pós-Graduação em Computação Aplicada da Unisinos.
Estudo sobre os impactos da tecnologia do futuro, elaborado por pesquisadores da Universidade de Oxford, estima que 47% dos empregos nos EUA estão altamente suscetíveis a serem automatizados nas próximas duas décadas. Os efeitos devem ser sentidos em áreas como transportes, logística, suporte em escritórios, funções administrativas e ocupações na indústria de serviços.
Ao contrário do que podemos imaginar à primeira vista, a revolução tecnológica não é exatamente uma corrida entre humanos e máquinas. Enquanto parece ser consenso que determinadas funções repetitivas e burocráticas perdem espaço no mercado de trabalho, em outras áreas muitas vezes essa relação tem uma característica complementar e permite que os funcionários se dediquem a atividades criativas. Esse processo criativo envolve colocar em prática diversos aspectos de originalidade nas tarefas diárias, seja um novo processo produtivo, por exemplo, para aumentar a eficiência do trabalho, ou para criar algo completamente novo, com o lançamento de novos produtos no mercado.
Relatório produzido pela Nesta, fundação independente criada pelo governo britânico, aponta que os empregos que lidam com soluções criativas são mais resilientes ao processo de automação. Isso porque os computadores conseguem simular o comportamento humano quando um problema é bem determinado, o que não acontece com tanta frequência quando as tarefas têm alto grau de interpretação. Esse é o caso de profissões como artistas, arquitetos, web designers, especialistas de TI, entre outros.
Mudanças à vista
Estudo elaborado pelo Fórum Econômico Mundial estima que mudanças disruptivas no mercado de trabalho eliminarão 7,1 milhões de empregos no período de 2015 a 2020, ao mesmo tempo em que serão criados 2 milhões de postos de trabalho. O documento prevê que a área mais afetada será a de serviços administrativos, enquanto as melhores oportunidades estarão concentradas em empregos relacionados a engenharia, arquitetura, matemática e computação.
A previsão com relação a esses empregos administrativos é explicada pelos avanços na tecnologia de nuvem, análise de Big Data e Internet das Coisas, aliados a fatores como eficiência energética e flexibilidade no ambiente de trabalho, o que coloca em dúvida a necessidade de manter grandes equipes nessas funções.
Essa nova realidade não afetará apenas empregos de baixa remuneração. Até mesmo as ocupações com os melhores salários, como gerentes financeiros, médicos e CEOs, podem ter parte da rotina automatizada. Pelo menos, essa é a conclusão de um estudo conduzido pela McKinsey, líder mundial no mercado de consultoria empresarial.
Na ponta positiva, de acordo com o material elaborado pelo Fórum Econômico Mundial, tendências como impressoras 3D, produção eficiente e sustentável e robótica devem tornar a manufatura um setor altamente sofisticado, em que funcionários de engenharia e arquitetura precisarão criar e gerenciar sistemas de produção cada vez mais avançados e automatizados.
Da mesma forma, especialistas em matemática e computação devem ser peças fundamentais na realidade em que empresas das mais diversas áreas buscam profissionais para aplicar ferramentas como análise de Big Data e visualização de dados, cada vez mais importantes para a tomada de decisões.
Competências do futuro
O avanço tecnológico, portanto, será acompanhado por uma transformação nas habilidades requeridas em todas as categorias de emprego, o que demanda requalificação dos trabalhadores para evitar escassez de talentos.
É por isso que, no âmbito acadêmico, universidades internacionais estão desenvolvendo núcleos e cursos específicos para tratar do tema da inovação. A Universidade de Oxford, por exemplo, criou a Oxford Martin School, organização reconhecida como uma das líderes mundiais por abordar os desafios e oportunidades do século 21. Com mais de 200 pesquisadores, a instituição promove a reflexão na sociedade e aponta caminhos alternativos.
No Brasil, algumas iniciativas também surgem nessa mesma direção. A Unisinos criou um núcleo de inovação e tecnologia, firmou parceria com o Parque Tecnológico de São Leopoldo e instituiu cursos interdisciplinares para qualificar profissionais com características múltiplas, que serão necessárias para o mercado de trabalho nos próximos anos.
Seja qual for a área de atuação, é importante se adaptar para aproveitar as melhores oportunidades do mercado. “O profissional precisa entender como a tecnologia impacta a vida das pessoas e a sua área de atuação”, afirma Cristiane Schnack, coordenadora do MBA de Mercados Criativos da Unisinos.
Do ponto de vista dos profissionais, Schnack recomenda, em linhas gerais, três passos básicos para se manter competitivo no mercado de trabalho: buscar cursos de qualificação para se manter atualizado com as novidades de sua área de atuação; ampliar o conhecimento para campos correlatos ao de sua atuação, como cursos de programação e gestão; aprender novas línguas, pois estar próximo a culturas diferentes proporciona uma visão de mundo ampliada, além da possibilidade de atuar em empresas cada vez mais globais.
Para Gustavo Borba, diretor de graduação da Unisinos, as competências do século 21 estão relacionadas a questões que vão além da profissão ou da perspectiva técnica. “A capacidade de resolver problemas, de pensar sistemicamente, de atuar com profundidade na área, mas conectado e interagindo horizontalmente, atuação ética e construção de uma visão cross-cultural são algumas das principais competências”, pontua.
Transformação sim, mas quando?
Parece certo que o mercado de trabalho passará por transformações nos próximos anos, mas o prazo para essa mudança é, ainda, uma questão em aberto. Daniel Puffal, professor do Mestrado Profissional em Gestão e Negócios da Unisinos, lembra que há um descolamento entre a tecnologia disponível e a capacidade financeira de as empresas inovarem.
Segundo os dados mais recentes do Anuário do Trabalho na Micro e Pequena Empresa, elaborado em 2013 pelo Sebrae em parceria com o Dieese, 99% das empresas privadas não-agrícolas do Brasil são de micro e pequenas empresas. Essas companhias, muitas vezes, não têm recursos disponíveis para investimentos.
Por isso, para Puffal, a transformação no mercado como um todo será mais longa, permitindo convivermos, ao mesmo tempo, com empresas que possuem tecnologia de ponta e outras mais tradicionais. “Tem espaço para os dois tipos de empresas, mas a mudança está acontecendo, e essas mais avançadas tecnologicamente terão mais sucesso”, prevê, alertando que as companhias tradicionais empregarão mão-de-obra menos especializada e, por isso, com salários menores.
Para Borba, a saída é compreender a complexidade em que vivemos e perceber os espaços a partir da perspectiva de sistema. “Entender que as conexões e as relações (entre pessoas, entre analógico e digital) são um componente fundamental é um caminho para manter a importância do indivíduo, em uma teia de relacionamentos”, finaliza.
Fonte: Infomoney