Há 50 anos, quando os engenheiros somavam pouco mais de 10 mil profissionais em todo o território nacional, conforme dados do Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (Confea), a categoria alcançou uma importante conquista: a Lei 4.950-A, promulgada em 22 de abril de 1966. Com a nova legislação, estabeleceu-se o piso profissional que não poderia ser inferior a “seis vezes o maior salário mínimo comum vigente no País para jornada diária de seis horas”. As horas excedentes a esse expediente deveriam ser remuneradas com acréscimo de 25%, que seria elevado para 50% a partir da Constituição de 1988.
Deu origem à lei o Projeto 3.204, apresentado em 21 de julho de 1961 pelo então deputado federal Almino Affonso, eleito pelo estado do Amazonas pelo Partido Social Trabalhista (PST). À época em seu primeiro mandato, ele relata ter sido “instado a valorizar a categoria que deveria crescer em quantidade cada vez maior para a execução de vasto programa de desenvolvimento nacional”. “A bem da verdade, elaborei o projeto inspirado no engenheiro e amigo Rubens Paiva (deputado federal eleito em 1962 pelo PTB por São Paulo, preso, torturado, morto e desaparecido em janeiro de 1971)”, esclarece Affonso, hoje com 87 anos de idade.
Meio século depois, quando os engenheiros já são cerca de 1,3 milhão, ele defende a pertinência da lei. “A minha propositura está mais atual do que nunca”, observa o ex-parlamentar, que também foi ministro do Trabalho do governo João Goulart, em 1964. A posição é confirmada pelo presidente da FNE, Murilo Pinheiro: “A luta pelo cumprimento da Lei 4.950-A/66 é bandeira permanente e prioritária da nossa federação. Trata-se de assegurar aos profissionais remuneração minimamente justa com a consequente valorização.”
Tal questão inclusive constava da justificativa do projeto do deputado: “[…] a essa valorização profissional do engenheiro e do arquiteto, e ao que se exige de esforço intelectual e de recursos materiais para o seu preparo técnico, não correspondem os salários que são atribuídos […]”. Segundo Pinheiro, a federação tem “atuado, em apoio aos nossos sindicatos filiados, com negociação, mobilização e até greves, para garantir que as empresas respeitem o piso. E também temos recorrido à Justiça que, em diversos estados, vem assegurando o direito da categoria”.
Ainda em 1961, o PL 3.204, em apreciação em três comissões técnicas da Câmara – Constituição e Justiça, Servidores Públicos e Finanças –, recebeu pareceres favoráveis e foi aprovado por unanimidade em todas elas. Em um desses relatórios, era reforçado o bom propósito da matéria de incentivar a formação desses profissionais “através de remuneração condigna”. Todavia, a matéria recebeu, na sequência, emendas e até um substitutivo, passando outras vezes pelas comissões da Casa; e no Senado também foram inseridas emendas, até a sua redação final.
Como lembra Affonso, apesar da inicial recepção positiva, o projeto enfrentou as intempéries do momento. “Estávamos num período político convulsionado, teríamos a renúncia do presidente Jânio Quadros”, pontua. A matéria levou quase cinco anos até a sua promulgação pelo Congresso Nacional, após ser vetada pelo então presidente Marechal Humberto Castelo Branco. Cassado pelo golpe civil-militar de 31 de março de 1964, Affonso não pôde acompanhar esse processo até a conclusão. “Tive que sair do País”, lamenta. Ele retornou depois de 12 anos de exílio. “Só quando voltei fui informado que o meu projeto tinha sido aprovado. Isso é para dizer que o meu mérito é bem pequeno nessa conquista. Mas é claro que fiquei na maior alegria.”
Luta que segue
A partir da promulgação da Constituição Federal, em 1988, a Lei 4.950-A passou a enfrentar questionamentos quanto a ter sido ou não recepcionada pela Carta Magna. O presidente da FNE, nessa questão, explica que há empregadores que recorrem ao artigo constitucional segundo o qual não pode haver indexação financeira ao salário mínimo para contestar a regra. “Como diversos juristas, inclusive o ex-ministro Francisco Rezek (do Supremo Tribunal Federal), já esclareceram e a Justiça Trabalhista tem entendido em várias partes do Brasil, isso não se sustenta”, afirma Pinheiro. Ele lembra que o piso diz respeito à remuneração pelo trabalho assalariado e, portanto, não se encaixa no veto da Constituição. “O uso dessa artimanha, além de não prosperar perante a Justiça, significa a falta de compreensão em relação à importância de assegurar remuneração minimamente adequada aos profissionais qualificados”, critica.
Como a Lei 4.950-A/66 não é válida para os engenheiros estatutários, uma luta da FNE é para que seja feita uma emenda à Constituição assegurando aos funcionários públicos os pisos salariais determinados em lei para sua categoria profissional. Enquanto esse processo não avança, a federação e os sindicatos têm atuado para que os municípios e estados adotem o valor estabelecido na legislação federal como referência para a remuneração dos profissionais. Segundo Pinheiro, várias administrações no País aprovaram planos de carreira com salários compatíveis com a reivindicação, “demonstrando sua compreensão quanto à importância dos engenheiros para o desenvolvimento local e bem-estar da população”. Ele ressalta, contudo, que essas vitórias, “obviamente, exigem mobilização, organização e esforço de negociação”.
Conforme reportagem do Engenheiro de junho último, a reivindicação por remuneração compatível com a Lei 4.950-A/66 obteve novas vitórias, sendo as mais recentes no estado de Roraima e nas cidades de São Paulo (SP) e Teresina (PI). Confira essas e outras conquistas, assim como o histórico da tramitação do projeto que deu origem à lei do salário mínimo profissional, no site da FNE. http://www.fne.org.br/index.php/lutas/salario-minimo-profissional