Em audiência pública promovida pela comissão especial que debate o projeto de privatização da Eletrobras (PL 9463/18) no dia 24/04, o ex-presidente da Agência Nacional de Águas (ANA) Vicente Andreu afirmou que as mudanças climáticas estão afetando o regime das bacias hidrográficas brasileiras, como a do rio São Francisco. Segundo ele, a situação impõe alterações no planejamento do setor hidrelétrico. O debate foi marcado para discutir a revitalização da bacia do São Francisco.
Para Andreu, o novo cenário, com a redução da vazão dos rios, vai exigir do poder público o papel de regulador para mediar as disputas que surgirão entre os usos múltiplos da água (consumo humano, geração de eletricidade, irrigação, navegação, entre outros). “Nós vamos ter que mudar a operação dos reservatórios do setor elétrico no Brasil. Vamos ter que sair da visão de segurança energética para visão de segurança hídrica”, afirmou. Ele defendeu que somente o poder público pode fazer o papel de mediação, daí a necessidade de manter a Eletrobras estatal, pois ela poderá atuar como braço do Estado.
Controle da água
O ex-presidente da ANA criticou ainda o modelo de revitalização do rio São Francisco previsto no projeto de desestatização. Conforme a proposta, uma parcela do valor de outorga recebido pelo governo pela concessão das usinas da Eletrobras será destinada a ações de recuperação do rio. São R$ 9 bilhões em 30 anos. Para Andreu, os recursos deveriam sair do setor privado e não das outorgas, que são receita pública.
Presente ao debate, o diretor-executivo da Secretaria de Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Sergipe, Ailton Rocha, disse ver com preocupação a venda da estatal. “O sistema Eletrobras é responsável por 52% das águas reservadas, acumuladas em 233 barragens. Privatizar esse setor em detrimento do uso múltiplo dos recursos hídricos é muito preocupante”, comentou.
O deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) concordou com os debatedores. “É impossível a inciativa privada solucionar conflitos de interesse, porque uma atividade econômica não vai ceder para outra atividade econômica. Nós temos de dar atenção para a soberania hídrica, e não para a soberania elétrica”, disse.
Pompeo de Mattos (PDT-RS) também demonstrou preocupação com o futuro da gestão das águas no país com a privatização da Eletrobras, que controla grandes barragens, como a de Tucuruí. “Quando nós tratamos de energia elétrica, estamos tratando da água. Estamos empurrando a Eletrobras com a água do Brasil junto. Então, isso não é razoável, não é aceitável e nós temos que denunciar isso”, declarou.
Modelo
O relator do projeto em discussão na comissão especial, deputado José Carlos Aleluia (DEM-BA), informou que estuda um modelo para revitalizar o rio São Francisco que usa como referência a Fundação Renova. A fundação foi criada em 2016, com recursos privados e gestão compartilhada entre setores público e privado, para recuperar as áreas e rios degradados pelo desastre de Mariana (MG). Em 2015, um rompimento de uma barragem da mineradora Samarco provocou o deslizamento de um grande volume de rejeitos de minério de ferro para os rios Gualaxo do Norte e Doce e matou 19 pessoas. O acidente ambiental é considerado o maior da história do Brasil.
Aleluia criticou a Chesf por não fazer mais investimentos na recuperação do rio São Francisco. “Nos últimos cinco anos, a empresa investiu apenas R$ 100 milhões no rio. Isso é nada”, apontou. “Todo mundo fala que o rio será privatizado. O rio hoje está mais do que privatizado. Está abandonado.”
Durante o debate, o deputado Fabio Garcia (DEM-MT) defendeu o projeto de privatização da Eletrobras. Para ele, o estado não tem mais meios de financiar o setor elétrico. A venda da estatal surge como uma alternativa para preservar o patrimônio já construído. “O que a gente tenta, na verdade, ao contrário do que dizem aqueles que são contra a privatização, é preservar o patrimônio do povo colocando uma gestão mais eficiente à frente dessa empresa”, sustentou Garcia.
Ele afirmou ainda que os governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff provocaram prejuízos à empresa, com redução de R$ 30 bilhões do patrimônio líquido e despesas acima das receitas. “Se não for privatizada, empresa não valerá mais nada. Vamos acabar destruindo um patrimônio.”
ÍNTEGRA DA PROPOSTA: PL-9463/2018
Fonte: Portal da Câmara dos Deputados