No mercado de trabalho, mulheres em geral ganham menos que homens. Esse é um fato observado em todos os cantos do mundo. Entender as razões por trás dessa diferença é crucial, pois pode sugerir caminhos e políticas para reduzi-la.
Claudia Goldin, de Harvard, é uma das principais pesquisadoras da área, focando especificamente na economia americana. Sua pesquisa aponta que um fator é bastante importante para explicar a diferença salarial: a preferência de mulheres por arranjos de trabalho mais flexíveis. Isso porque elas acabam se envolvendo bem mais do que homens nas tarefas de cuidar dos filhos. Estão, assim, menos disponíveis para trabalhar longas horas seguidas, ou para atender ao chamado do chefe ou do cliente quando solicitadas. A flexibilidade de horários também ajuda se precisarem levar filhos ao médico ou participar de reuniões na escola, por exemplo.
Só que essa flexibilidade tem um preço, que se reflete em uma diferença salarial em relação aos homens. Afinal, empregadores estão dispostos a pagar mais por uma pessoa que pode ajustar seus horários em função das necessidades do patrão ou cliente.
Por que essa história faz sentido? Porque a diferença salarial entre homens e mulheres é particularmente elevada no mercado financeiro e entre advogados, justamente ocupações em que se espera que o empregado esteja disposto para trabalhar longas horas, e possivelmente a atender as necessidades do empregador a qualquer hora do dia. Por outro lado, na área de ciência e tecnologia, em que esse aspecto não é tão importante, a diferença salarial entre homens e mulheres é pequena.
Outro dado importante que reforça esse ponto: entre os recém-formados em universidades nos Estados Unidos, a diferença entre homens e mulheres é também pequena. Mas ela aumenta muito ao longo do tempo, justamente na época em que mulheres tendem a ter filhos.
A evolução da diferença salarial em uma profissão específica –farmacêuticos– também indica a importância do mecanismo em questão. Há 40 anos, o profissional responsável pela farmácia tinha horários bastante rígidos (de abertura e fechamento do estabelecimento) e frequentemente precisava estar disponível para atender clientes fora do expediente. Hoje, farmácias independentes deram lugar a cadeias nacionais de estabelecimentos.
Mudanças tecnológicas permitem que o atendimento não seja necessariamente presencial, e a padronização de remédios reduz a importância do conhecimento específico do profissional.
Tudo isso contribuiu para que farmacêuticos se tornassem mais substituíveis entre si. Se um profissional precisar se ausentar, outro pode facilmente ocupar seu lugar. Para mulheres, que tendem a preferir um arranjo mais flexível para acomodar suas atividades em casa, é uma opção bastante favorável. Assim, a diferença salarial entre gêneros, que era grande há quatro décadas, reduziu-se drasticamente nesse caso. Nos Estados Unidos, atualmente, a profissão de farmacêutico apresenta uma das menores diferenças salariais entre homens e mulheres.
Os resultados da pesquisa de Claudia Goldin sugerem como é difícil reduzir a diferença salarial entre sexos. Aspectos culturais certamente contribuem para isso, na medida em que a mulher ainda é a principal responsável por cuidar dos filhos –e, em uma fase posterior da vida, por cuidar de idosos. A redução na diferença passa por uma divisão mais equitativa desse trabalho, com o homem passando a se engajar mais nessas atividades.
Isso, porém, não é algo que ocorrerá da noite para o dia. Adicionalmente, dado que existe uma diferença salarial, muitos casais acabariam sofrendo uma redução de renda se o homem não se especializasse no mercado de trabalho. E isso reforça o padrão cultural.
Apesar da pesquisa se aplicar aos Estados Unidos, ela também traz uma reflexão importante para o caso brasileiro. Afinal, lá como cá, a mulher acaba sendo a principal responsável pelo cuidado com os filhos – o que potencialmente limita suas opções no mercado de trabalho.
Fonte: Folha SP