O crescimento populacional e a urbanização desordenada trazem um problema silencioso e muitas vezes ignorado: a contaminação ambiental causada por cemitérios. Embora pouco debatido, o impacto sobre a qualidade da água e a saúde pública é alarmante, especialmente quando não há práticas adequadas de gestão.
A legislação exige estudos de impacto ambiental e controle na localização de cemitérios, mas sem fiscalização eficiente e gestão municipal comprometida, essas normas tornam-se pouco eficazes. Para mitigar os riscos, é fundamental integrar a gestão dos cemitérios aos planos diretores municipais, ao ordenamento territorial e, principalmente, aos planos de saneamento básico.
O Novo Marco do Saneamento (Lei 14.026/2020) obriga os municípios a elaborarem planos para acessar recursos destinados à infraestrutura sanitária. No entanto, muitos desses documentos negligenciam os cemitérios como potenciais fontes de contaminação. Sem esse diagnóstico, é difícil captar investimentos para monitoramento e adoção de tecnologias mais seguras, como cemitérios verticais e sistemas de drenagem controlada.
A decomposição dos corpos libera necrochorume, um líquido altamente poluente rico em substâncias como putrescina e cadaverina, que pode infiltrar-se no solo e atingir lençóis freáticos, comprometendo a água utilizada para consumo. Estudos apontam que cemitérios mal planejados são fontes significativas de poluição hídrica, representando um risco sanitário para comunidades inteiras.
A solução passa pelo planejamento e pela atuação de profissionais capacitados. Engenheiros especialistas desempenham um papel crucial na busca por alternativas sustentáveis. Alguns municípios já adotam medidas inovadoras, como barreiras geotécnicas e sistemas de monitoramento da qualidade da água subterrânea. Mas essas práticas precisam ser ampliadas.
Estamos preparados para encarar essa realidade? O futuro dos cemitérios deve ir além da preservação da memória dos que partiram. Trata-se de uma questão urgente de saúde pública e responsabilidade coletiva. Municípios, gestores e sociedade precisam agir agora para evitar que esse problema invisível se torne uma ameaça irreversível.
Roberta Maas dos Anjos
Engenheira civil, sanitarista e ambiental, presidente do Senge-SC