O investimento total na infraestrutura brasileira perdeu espaço na economia nos últimos anos, mas o setor de eletricidade e gás vem conseguindo se descolar da maré ruim e atrair bilhões de dólares de estrangeiros.
Em meio à sobra de recursos globais, franceses, indianos, espanhóis, latino-americanos e principalmente chineses têm sido atraídos por negócios considerados promissores entre transmissoras e geradoras de energia, além de transportadoras de gás.
Como resultado do bom momento, os aportes externos no segmento de eletricidade e gás explodiram em 2017 e, segundo especialistas, devem manter o ritmo nos próximos anos.
Um dos casos mais emblemáticos em 2017 foi o leilão de quatro usinas da Cemig, que arrecadou R$ 12 bilhões e foi arrematado pela chinesa Spic, a franco-belga Engie e a italiana Enel.
Dados do Banco Central mostram que, como um todo, o investimento estrangeiro direcionado ao setor produtivo (modalidade chamada de “participação no capital”) cresceu 12,3% em 2017, totalizando US$ 60,3 bilhões.
Incluídos nesse total, os recursos investidos em eletricidade e gás quadruplicaram, chegando a US$ 12,6 bilhões. Em termos percentuais, a fatia dos investimentos no segmento passou de 5% para 21% de 2016 para 2017.
A tendência é que o setor de eletricidade siga em destaque, como mostram as intenções de investimentos na economia coletadas pelo Ministério do Desenvolvimento.
O setor de eletricidade e gás lidera os anúncios de novos projetos, com US$ 4,2 bilhões em intenções de investimentos registradas apenas entre julho e setembro de 2017. Bem à frente do segundo colocado, o setor de P&D (Pesquisa e Desenvolvimento), com US$ 3 bilhões.
Por capital de origem, os chineses só perdem para os brasileiros. Fortes economicamente, eles dominam as complexas obras de transmissão, que exigem o transporte de grandes blocos de energia por longas distâncias e precisam de muitos recursos, diz Claudio Frischtak, diretor da Inter B Consultoria.
Além de chineses, os europeus –velhos conhecidos do setor– agora se voltam para a geração de energia renovável (solar e eólica), que vem se provando cada vez mais viável economicamente.
Para além de chineses e europeus, há uma expectativa de ampliação da gama de interessados. Renato Polizzi, diretor de investimento do Banco Modal, ressalta que indianos, como a Sterlite, latino-americanos, como a Isa, e fundos de pensão estrangeiros atuam cada vez mais no lugar de estatais e de grandes empreiteiras nacionais que dominavam principalmente os leilões de transmissão.
MP 579
Segundo especialistas, a atratividade do setor de energia se ancora em um misto de potencial do país, bons ativos e segurança regulatória, abalada pela MP 579, de 2012.
A medida foi elaborada no governo Dilma com o propósito de reduzir os custos ao consumidor em detrimento do lucro das empresas. Ela travou o setor e o seu desmonte tem sido crucial para o retorno dos investimentos, diz Marcelo Allain, ex-secretário do Programa de Parcerias de Investimento durante o governo Temer e hoje sócio da consultoria BR Infra Group.
As mudanças feitas pela ex-presidente geram inseguranças e disputas judicias até hoje no mercado, mas quem voltou a investir mais rápido obterá retornos interessantes, diz Polizzi, do Modal.
Com a melhora do cenário regulatório, os investimentos externos devem continuar.
“Em 2018, o perfil de investimentos também deve ser de estrangeiros. Vai depender do apetite do governo para leilões”, diz Ana Karina Souza, sócia do Machado Meyer.
Souza destaca leilões de transmissão e de geração, ainda no primeiro semestre. Além disso, diz ela, há ativos importantes que deverão ser colocados à venda neste ano, como a Cesp (Companhia Energética de São Paulo) e ativos da Eletrobras.
O gás também se mostra cada vez mais atrativo. “De refém da Bolívia, o país agora é produtor de gás, que vem do pré-sal. Como o pré-sal está em fase ascendente, vai ter muito gás”, diz Frischtak.
Os investimentos que devem continuar sendo feitos em eletricidade e gás são importantes também porque estimulam o crescimento de longo prazo e a produtividade do país, diz Luis Afonso Lima, diretor-presidente da Sobeet, entidade cujo foco é a inserção internacional.
Em 2017, os investimentos em infraestrutura atingiram seu ponto mais baixo nas últimas cinco décadas, de 1,37% do PIB (Produto Interno Bruto), segundo a Inter B.
Fonte: Folha SP