A velha fórmula de promover mudanças na Previdência Social retoma ao centro do debate e tem sido refutada pelos representantes dos trabalhadores, que consideram “inoportuna qualquer proposta de reforma que signifique supressão ou restrição de direitos adquiridos”.
A justificativa para a medida, que já havia sido anunciada no início do segundo mandato do Governo Dilma e ganhou destaque no governo interino de Michel Temer, também não é nova: o regime seria deficitário e uma reforma seria necessária para sanar esse problema. Argumento que é rebatido tanto por sindicalistas quanto por especialistas. Entre eles, Denise Lobato Gentil, professora de Macroeconomia e Economia do Setor Público do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que aponta: “É um falso discurso. Está sendo usado para alardear a população que se trata de um sistema quebrado e que, portanto, é necessária uma reforma, que implica corte de gastos e, por sua vez, de benefícios.” A afirmação foi feita em entrevista ao Engenheiro, em abril último – respaldada por dados apresentados pela docente durante o III Curso de Formação Sindical da Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários Regulamentados (CNTU), em outubro de 2015, em Maceió (AL) (confira em http://goo.gl/8do6f1). “O déficit na seguridade social é uma verdadeira farsa. Somente no último ano, houve superávit de R$ 54 bilhões”, enfatiza o senador Paulo Paim (PT-RS). Ele lançou, juntamente com o deputado federal Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), em junho último, a Frente Parlamentar Mista em Defesa da Previdência. Em pauta, a retomada do Ministério da Previdência e o enfrentamento à reforma.
Propostas e resistência
O governo interino sinalizou mudanças na idade mínima à aposentadoria, que seria unificada em 65 anos para homens e mulheres. Estariam previstas regras de transição aos trabalhadores na ativa. Também se ventilou a ideia de desvincular o benefício do valor do salário mínimo. Alterações rechaçadas pelos sindicalistas. Para Ricardo Patah, presidente da União Geral dos Trabalhadores (UGT), alterar a idade mínima seria discriminação contra os mais pobres, que são os que começam a trabalhar mais cedo. Tampouco é aceitável, conforme ele, a equidade entre os gêneros proposta. “As condições são desiguais. A mulher ainda ganha menos que o homem, tem dupla jornada, é assediada”, lembra. Segundo Nailton Francisco de Souza, diretor nacional de comunicação da Nova Central Sindical de Trabalhadores (NCST), por unanimidade, as centrais definiram que não aceitam negociar esses dois pontos. “Mudanças nas regras previdenciárias já foram efetuadas e, infelizmente, a redução de direitos dos trabalhadores, dependentes e aposentados tem sido a regra”, completa.
Segundo divulgado no site do Ministério da Previdência e do Trabalho, o titular da pasta, Ronaldo Nogueira, afirmou durante audiência pública em 15 de junho que os pontos consensuais alcançados junto ao movimento sindical até o momento são ações mais eficientes na arrecadação e combate à sonegação. “A reforma da Previdência é questão complexa e profunda. Afetará, no médio e longo prazos, 120 milhões de pessoas, mais da metade da população economicamente ativa”, frisa Juvenal Pedro Cim, secretário de finanças da Central dos Sindicatos Brasileiros (CSB). Sob essa ótica, conforme ele, a entidade – juntamente com a UGT, NCST e Força Sindical – apresentou ao governo interino uma série de propostas para melhoria de gestão e arrecadação do sistema, entre elas: fim da Desvinculação de Receitas da União (DRU) sobre o orçamento da seguridade social, revisão de alíquotas de contribuição do agronegócio, melhor fiscalização, fim das desonerações das contribuições previdenciárias na folha de pagamento e alienação de 3.485 imóveis da Previdência que não estão sendo usados. “Apresentamos proposta que permite recuperar R$ 70 bilhões por ano aos cofres da Previdência. São ainda R$ 370 bilhões somente de empresas que devem”, complementa João Batista Inocentini, presidente do Sindicato Nacional dos Aposentados e vice-presidente da Força Sindical.
João Cayres, secretário-geral da Central Única dos Trabalhadores (CUT-SP) e da direção nacional da central, enfatiza: “Somos contra a proposta de reforma, desde o governo Dilma. Vamos seguir mobilizando os trabalhadores à luta e realizando amplo debate com eles. Não concordamos com o discurso de déficit. É necessário uma discussão mais séria sobre o papel fundamental da Previdência à distribuição de renda.” Na mesma linha, Adilson Araújo, presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), critica o que chama de “pacote de maldades de Temer”: “Ele quer aniquilar as conquistas obtidas. Sobre a idade mínima passar para 65 anos, a média de vida de um alagoano é 66,2 anos. Gozaria apenas 1,2 ano. Seria aposentadoria com pé na sepultura.”
Murilo Celso de Campos Pinheiro, presidente da FNE, ressalta: “A medida é claro atentado aos direitos dos trabalhadores, especialmente aos mais pobres que, em geral, começaram sua vida laboral mais jovens. Atualmente, para se aposentar, o trabalhador está sujeito à incidência do fator previdenciário, que reduz seu benefício conforme a sua expectativa de vida, ou à fórmula 85/95 de forma progressiva. Ou seja, já existem suficientes controles de acesso à Previdência Social, sendo desnecessário que se criem outros e piores.” E conclui: “Se o objetivo for controlar as contas do governo, seria mais justo, e também mais eficaz, que se baixasse a taxa de juros responsável por gastos da ordem de R$ 600 bilhões por ano com o serviço da dívida pública.”
Matéria publicada, originalmente, no jornal Engenheiro, da FNE, Edição 170, julho de 2016